terça-feira, 1 de maio de 2012

A dois passos

Procurei, sozinho, o frio. Procurei o calor. Sorri chorando e chorei sorrindo. Depois, apenas sorri e levantei. Levantei pra continuar, lembrar e me orgulhar. Levantei a cabeça. Agradeci quando me vi mais feliz. Quando me vi mais forte. Quando me vi mais eu mesmo. Esse foi o resumo dos meus últimos dias. Agora que resolvi postar aqui de novo, pensei muito sobre a maneira que estive escrevendo. Ás vezes, me sinto como uma menininha que ganhou um diário pra escrever qualquer coisa da própria cabeça. Como se todos que eu conheci antes de vir pra cá fossem amigos imaginários. Percebi que meu objetivo não é apresentar a Austrália que meus olhos têm visto. Meu objetivo é fazê-los sentir a Austrália que meu coração e minha mente têm sentido. Enfim... Mãos pro céu! Obrigado, vovô!

Poucos dias depois do triste ocorrido, conhecemos Cronulla, praia que se mantinha, até então, escondida da nossa rota, há uns trinta minutos de casa, de trem. Enquanto caminhávamos a terceira quadra até a praia, eu começava a enxergar o mar. Descendo alguns morrinhos de grama lisa, como um tapete vermelho, mas verde, se chega na praia. Alguns pinheiros enormes engrandecem o caminho. Ao canto, o point break com direitas fortes e cavadas. Fiquei em silencio, alguns minutos, observando o mar. A italiana, Elena, que mora com a gente na shared, foi junto nesse dia, para conhecer. Nessa hora, ela ria da minha cara e dos meus comentários, falando sozinho, em português, a cada parede que rolava. Contei pra ela que esperei por isso minha vida toda. Que eu não podia acreditar que realmente estava surfando nesses picos. Eu, que já me esfomeava ao olhar, dos molhes, do morro do farol ou da pontezinha do Bulldog, um bom Swell entrando, vejo tudo aqui como se eu fosse um vira-latas dentro de um açougue, sem ninguém para vigiar.
Nesse dia, já era noite quando resolvi sair do mar. E eu só saí porque, na água, plantas marinhas raspam nas pernas o tempo todo. Nunca se sabe se não é algum monstro marinho. Em Cronulla, um dos perigos do mar é o "blue ringed octopus", um polvo colorido e venenoso que se esconde de dia e, de noite, procura lugares mais rasos para se alimentar de siris e carangueijos. Nunca soube a diferença entre esses dois ultimos.


Sentado na prancha, olhando as estrelas, contei ao meu avô que dedicaria minha saideira à ele. Me afobei e entrei todo errado na onda e embiquei. Sorri: "Não, vovô. Essa não valeu. Considera a próxima." Acho que ele não se importou. Provavelmente, deu risada do meu caldo. E aí veio uma das minhas melhores esquerdas. Sei que ele nunca se abriu muito para o surf, mas sei também que ele sorria de maneira surreal quando me via realizado e feliz. Mais do que meu desempenho, dedico à ele toda a minha felicidade.
Após o surfe, enquanto comíamos, tocava um Purple Haze, do Hendrix, em pleno Mc Donalds. As loirinhas, sempre estilosas e bem produzidas, mas sem excessos, como eu já via em vídeos ou "live cams" do WCT, no estilo Laura Enever, a musa de Narrabeen do surf mundial, já caminhavam ao encontro dos bares e pubs. Em frente à um bar, um músico que tocava no violão Champagne Supernova, do Oasis, recebeu toda a minha admiração. Confesso que o som do Oasis não é dos que mais me agrada, mas a música caiu perfeitamente para fazer o meu pós surf. Justamente uma das que tocou no meu mp3 enquanto escrevia o texto anterior desse blog.
Aqui se ouve música boa por toda a parte, principalmente vinda dos músicos de rua. Nunca dei uma moeda, mas sempre faço questão de saudá-los com as mãos, sei que é a principal recompensa para um artista. Não é a toa que eles agradecem com um sorriso mais largo do que quando ganham dinheiro. Até eu já tive meus momentos nas ruas tocando uma gaitinha harmônica para ganhar uns dólares, viajando em linhas de blues. Sei como é gratificante, desde a criança que pára e fica olhando, atrasando a mãe, até o senhor bacana, que larga mais de um dólar.
Ao decorrer dos dias seguintes, Cronulla foi fazendo meus melhores surfes e pós surfes da vida, até agora. No último domingo, a boa ondulação falou mais alto na minha cabeça do que o churrasco com a turma da escola. E valeu demais... As ondas estavam grandes e fortes. Só senti, quando saí do mar, meu nariz anestesiado com o frio. Um dos vestiários de Cronulla não é coberto e permite ver a lua, as estrelas, algumas se mexendo, e as árvores ao vento. E também permite que, se alguém passar de helicóptero, te veja pelado, como disse o meu irmão.
Antes desse domingo, ainda teve o dia do arco-íris, que cruzou o céu inteiro após a chuva, como no dia 31 de Dezembro de 2011, em Torres. Esse realmente me deixou maluco. Lembrei das minhas últimas palavras para a família, no texto que escrevi antes de vir.


Certa vez, um sábio e uma criança observavam um arco-íris.
Dotado de experiência de vida, o sábio contou a criança:
“No final do arco-íris existe um tesouro!”
A criança ouviu atentamente, olhando nos olhos do sábio, e voltou a observar o lindo fenômeno da natureza. Depois de um tempo imóvel, ela respondeu:
“O que quero eu com tesouro, se aos meus olhos já foi entregue a benção do arco-íris?”
O sábio permaneceu imóvel observando o arco-íris.

Nesses últimos dias, aproveitei mais do que nunca o entardecer e o luar tocando uma viola no Rockdale Park, pertinho de casa. O lugar parece as florestas dos desenhos da Disney e, a qualquer momento, tu imagina que pode aparecer um gato maluco, te dando conselhos, em cima de uma árvore. Ali tem sido como o meu "lugar no final da rua sem saída", só que na Austrália.


Na primeira noite que estive ali, lembrei muito de uma música de uma banda moderna que eu mal conheço, mas que tocava muito no rádio quando eu voltava pra casa de T9, em Porto Alegre, e que tem uma letra bonita. Tive que tocar, exatamente como na foto, acompanhado pelo vento, as árvores e alguns passarinhos sem sono. Depois, em casa, dei uma olhada certinho na letra haha...


Lá no alto, às vezes, alguns morcegos passam voando. Mais alto ainda, aviões decolam, de 5 em 5 minutos, produzindo altos sons de turbina. Sons que me fazem lembrar as noites em Porto Alegre, que eu e o André íamos de carro até o aeroporto ouvindo Johnny Cash, sem vontade de ir à algum Hip Hop Mix Happy Fun Rehab da puta que pariu, e bebíamos uma ceva vendo os aviões decolarem.
Porra! Que amigos brother que eu arrumo. A pouco eu falava aqui pro meu irmão que eu me tornei quem eu sou, muito porque eu sempre tive os amigos certos. Não só no colégio, como na faculdade e aqui mesmo. Pessoas certas, que me libertam pra agir com a mais sincera espontaneidade. Tudo o que eu vejo, eu lembro de alguém e sinto alguma coisa boa. Apesar de ser tudo muito afude e diferente, é estranho agir como um retardado nas noites sem o João Gabriel pra agir junto, não encontrar a Grazi bebaça e rir pra caralho. Acompanhar o futebol pela internet, e nao no estadio com o Montanha e o Berna. Não posso deixar de citar aqui as palavras da Carol, depois do triste ocorrido. Ela disse: "tu é um dos únicos caras que eu conheço que sabe enfrentar essa situacao com a honra de um homem e o coração de uma criança." é uma honra pra mim saber que alguem pensa isso de mim.
Muito obrigado a todos os que me deram força. Tudo isso foi fundamental para mim.

Nas noites, a coisa mais barata que se tem pra beber é a cerveja Tooheys, do "veado", de 5 a 7 dólares. Baratinho, né? Os comerciais são bem diferentes dos das cervejas do Brasil. É engraçado porque a propaganda aqui, em geral, é agressiva, do estilo "BUZZ - LIGHT - EAR! Nao é um brinquedo que voa..." Deixo esse aí, da ceva, que é mais calmo, bem produzido e bem popular, pra quem quiser dar uma conferida:


A concentra é sempre regada a vinho, que é a coisa mais barata aqui. E, além de, na maioria das noites, só deixarem entrar se a gente tá vestido socialzinho, na entrada, tem que segurar o trago e controlar as pernas. Muito bêbado não entra, a gente já comprovou. Portanto, se voce for a Australia, NAO VA a noite desse jeito:


A música raramente passa das eletrônica, house, Hip Hop, quase sempre um "I just came to say hello", e todo mundo sabe cantar tudo. Numa das ultimas noites foi engraçado quando tocou a música do início do Rei Leão e as pessoas levantaram as mãos como se segurassem um Simba invisível.

Tá, acho que já escrevi demais. No estilo do meu amigo Rafael, de São Paulo, fã da "chocolatera quentera de só uma doleta" do 7-Eleven, em Manly, eu diria que Sydney é um puta lugar da hora, meu. Aprendi muito sobre eu mesmo com o carinho que recebi dos outros nos últimos dias, do Brasil e daqui. Lembrei como é bom aprender com os outros. Conhecer ao máximo o que é diferente.


Alguns dias atras, andei pensando se o meu cachorro vai lembrar de mim, quando eu voltar. Um dos meus maiores presentes foi ve-lo erguer as orelhas e me procurar pela casa, enquanto eu falava no Skype.
Nesses ultimos dias, percebi o quão sortudo eu sou por nem sempre ter sido o homem que teve a existência mais bela, mas por sempre ter conseguido ver beleza nas coisas mais simples e puras. Me despeço com a música mais clichê possível, mas muito significativa, da velha Blitz do Seu Mesquita.
Só na ispontainedadjjjj...

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